Você está assistindo à final do campeaonato num estádio de futebol e
seu time está ganhando. Falta pouco para o jogo acabar, mas um gol do
adversário pode estragar tudo. Você está à beira de um ataque de nervos
porque aqueles minutos finais não terminam nunca. Enquanto isso, a
torcida do outro time alimenta a esperança de um empate, mas o tempo
está passando depressa demais e nada desse gol acontecer.
O lugar e a quantidade de minutos decorridos são os mesmos, mas os
sentimentos das torcidas são bem diferentes e a forma como elas sentem o
tempo passar também. Segundo o professor William Gomes, do Instituto de
Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), esta
situação ilustra bem como a percepção do tempo pode variar de pessoa
para pessoa e de acordo com a situação.
Ele explica que, para a psicologia, o tempo “é a medida dos nossos
julgamentos. O seu tempo psicológico não corresponde ao cronológico. Ele
corresponde ao estado momentâneo de sua consciência”, completa. Então
sim, é totalmente possível que o tempo voe ou se arraste em alguns
momentos. Mas por que isso acontece?
Segundo o professor William, nosso tempo vai depender de como estamos
nos sentindo, bem como da nossa atitude em relação ao passado e ao
futuro. Por exemplo: quando está em jogo alguma coisa que te desafie e
direciona sua atenção para o futuro, as horas podem passar voando. Tipo
uma entrevista de emprego ou uma prova importante como o vestibular.
Tudo por causa da ansiedade.
O professor José Lino Oliveira Bueno, da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da USP em Ribeirão Preto, é referência nos estudos
sobre o tempo, tanto no Brasil quanto lá fora. Ele descobriu que
estímulos vindos da arte – principalmente música e artes plásticas –
podem influenciar nossa percepção temporal e revelar outros motivos para
essas distorções.
Um estudo orientado por ele expôs voluntários a trechos musicais
curtos e pediu que informassem qual havia sido a sua duração. O
resultado revelou que, quando a música terminava em uma tônica (como a
dos Pôneis Malditos), a estimativa era próxima do real. Mas eles tinham a
impressão de que o tempo havia passado mais depressa quando a música
terminava distante da tônica. “O participante tem uma experiência de
algo inacabado e subestima a duração do tempo do estímulo apresentado”,
explicou José Lino.
Quanto mais uma coisa te incomoda, mais o tempo tende a se arrastar. O
professor William explica que um momento em que a pessoa precise lidar
com algo que a tenha perturbado gravemente no passado provavelmente será
mais longo, porque fará com que ela fique remoendo lembranças dolorosas
e reavaliando suas atitudes.
Pesquisas têm relacionado a duração de um evento com a quantidade de
energia gasta pelo cérebro naquele momento. Em outras palavras, o seu
cérebro está trabalhando mais nessas horas, o que dá a impressão de que o
tempo está passando mais devagar. Para ilustrar: quando você olha uma
foto da casa em que passou sua infância, há muito mais coisa acontecendo
em sua mente do que quando você vê uma foto que não lhe diz nada, mesmo
que seja exposto a elas pelo mesmo período de tempo. A mesma coisa
quando você está assistindo a um filme ruim que não acaba nunca – sua
mente começa a trabalhar mais para encontrar meios de se distrair.
Excitação e perigo também podem fazer com que o tempo pareça passar mais devagar. Em um experimento conduzido no ano passado,
pesquisadores da Universidade da Califórnia pediram a voluntários que
estimassem por quanto tempo um ponto aparecia numa tela, ao mesmo tempo
em que analisavam sua atividade cerebral por meio de ressonância
magnética. Algumas vezes, o ponto aumentava de tamanho, dando a
impressão de que estava se aproximando, e outras vezes diminuía,
parecendo se afastar. No primeiro caso aconteceu algo curioso: os
participantes superestimavam o tempo em que o ponto aparecia, o que não
acontecia quando o ponto dava a impressão de estar se afastando. Nesse
momento em que o tempo parecia passar mais devagar, estavam mais ativas
as áreas cerebrais relacionadas a autojulgamentos e reflexões – o
cérebro estava ocupado pensando sobre si mesmo, seus planos e
atividades. Mas ativaram-se também áreas relacionadas à excitação,
perigo e sentimentos negativos. Faz sentido: algo se aproximando de você
pode ser ameaçador; assim, seu cérebro precisará se preparar de alguma
forma e buscar recursos para reagir, o que o fará com que trabalhe mais –
e, assim, o tempo parece passar mais devagar. Nada aconteceu quando o
ponto se afastava, pois nesse caso foi ativada no cérebro a região
associada à sensação de segurança – um objeto se afastando não é
ameaçador, o que dá a permissão para que você relaxe.
Os fatores emocionais na percepção do tempo
Tempo também tem a ver com emoção. Em um estudo do professor José
Lino, voluntários ouviram trechos da obra musical “Quadros de uma
Exposição”, de Modest Mussorgsky, mas apenas metades deles receberam
informações de alto teor emocional sobre a composição dessa obra (ela
foi feita homenagem a um grande amigo de Mussorgsky que havia falecido).
Quem sabia sobre o drama sentiu o tempo passar mais devagar.
Segundo outro estudo, o andamento das músicas também influencia a
percepção temporal. Foram compostas músicas nos sete modos eclesiásticos
musicais (escalas com diferente distribuição de intervalo de notas).
Trechos com mesma duração, mas diferente modo musical foram percebidos
como tendo duração diferente. “Cada modo pode ser associado a estados
emocionais diferentes (uma música lenta é associada à tristeza; se
aumentamos o andamento, ela passa a ser percebida como alegre), o que
indica uma relação possível entre estado emocional e tempo subjetivo”,
afirmou José Lino. “Essas alterações de tempo têm sido explicadas em
função da complexidade dos estímulos a que a pessoa se expõe, das
expectativas geradas por esses estímulos ou do grau de atenção produzido
pela experiência da audição musical”, explica.
Dá para controlar a forma como sentimos o tempo passar?
Dá, mas você vai precisar de uma boa dose de concentração. “Controlar
o tempo depende da sua capacidade de dirigir a consciência para os
objetos e colocar as suas preocupações em suspenso”, disse o professor
William. “A filosofia oriental, com a prática da meditação, também
ajuda, pois possibilita à pessoa ausentar-se ou afastar-se do tempo”,
completa. Mas esses recursos são difíceis e limitados – e a correria do
dia a dia não ajuda. Se você tem uma tarefa complexa e pouco tempo para
executá-la, por exemplo, não vai encontrar soluções milagrosas. Ainda
mais porque o estresse e a ansiedade que essa situação pode causar podem
acabar agindo para que você “trave” e fazem o tempo passar ainda mais
depressa. A concentração vai ajudar, mas não te dá superpoderes.
Saiba mais...
“Decifrando o tempo presente”, organizado por Luiz Menna-Barreto, José Carlos Bruni e Nelson Marques. Editora UNESP.
O livro reúne artigos de pesquisadores de diferentes áreas que
analisam a experiência de tempo subjetivo do presente. O tema é abordado
segundo as perspectivas da física, filosofia, psicologia, literatura,
biologia e história, entre outros.Leia Mais Webconquista News | Vitória da Conquista
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